A responsabilidade civil do médico ante a aplicação de técnicas e medicamentos experimentais ou a não aplicação de tais técnicas e medicamentos.



O avanço da ciência médica com o surgimento de várias técnicas e medicamentos novos para tratar velhas patologias, traz a lume uma discussão muito interessante:  pode o profissional médico ser responsabilizado civilmente se aplicar ao paciente uma nova técnica ou um novo medicamento em detrimento de outra técnica ou conduta médica já consagrada ou de outro medicamento cujos efeitos já são conhecidos?

 

 E ainda, faz-se a questão de maneira inversa: Pode o profissional médico ser responsabilizado se aplicou ao paciente conduta e técnica médica ou ainda remédio já consagrados e conhecidos, que não surtiram o efeito desejado, em detrimento de usar novas técnicas e novos medicamentos que poderiam tê-lo surtido?

 

Há observar-se inicialmente, antes de partir-se para a resposta  dessas perguntas, que após o advento do Código de Defesa do Consumidor ( Lei Federal n.º 8.078/90), a responsabilidade do médico, profissional liberal,  passou a ser regida também pelo mesmo dispositivo, tratando-se de uma relação de consumo, onde o médico é o fornecedor e o paciente o consumidor dos serviços do primeiro.

 

A aludida lei, entretanto, atribui aos profissionais liberais a responsabilidade subjetiva, onde ter-se-a que comprovar que os mesmos agiram com culpa ( negligência, imprudência ou imperícia) ou dolo ( com vontade de agir).É de se observar que no caso dos médicos, sua obrigação contratual para com o paciente é de meio e não de resultado[1], ou seja a obrigação do médico é de usar de todo o seu conhecimento, habilidade e ciência (meios dos quais dispõe) para atingir ao objetivo desejado com aquela intervenção.

 

Daí conclui-se que o médico, em regra,  somente será punido civilmente se prejudicou seu cliente e paciente por ter agido de maneira negligente ou imprudente, ou por ser imperito para aquele tipo de intervenção médica ( não é especialista, p. ex.), ou ainda por desejar causar o dano ao  paciente ( dolo). Somente poderá ser punido o médico se deixou de empregar técnica e conduta, ou ainda de utilizar medicamentos, dos quais dominava e tinha conhecimento.

 

É ainda um requisito para que o médico possua tal obrigação que as técnicas e condutas a serem usadas bem como os medicamentos a serem receitados tenham a aprovação e conhecimento do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Medicina, posto que sem essa autorização não está o médico obrigado a fazer uso dos mesmos.

 

No que pertine a primeira questão formulada neste artigo  pode-se afirmar que o médico poderá responder civilmente se, mesmo agindo com prudência e sem negligência, usa de técnicas ou condutas médicas novas, ou ainda prescreve medicamentos novos sem a chancela do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Medicina e estes vêm a causar danos ou mesmo a morte do paciente.

 

A única hipótese em que a jurisprudência tem admitido a possibilidade supra apresentada é o fato de estarem tais técnicas e medicamentos em fase de testes, cujos efeitos colaterais não são num primeiro ponto mortais, e há autorização expressa do paciente ou de sua família para que tais medicamentos ou técnicas sejam usados como último recurso de salvação do paciente.

 

Neste caso prevalece o princípio jurídico do risco tecnológico, bem como da prevalência da vida humana.

 

Já quanto à segunda questão suscitada, há aplicar-se o raciocínio também de maneira  inversa. Não poderá o profissional médico ser punido civilmente porque aplicou técnica, procedimento ou medicamento de efeitos conhecidos, ainda que estes não atinjam a seu fim desejado. Não é entendido pelos tribunais que o profissional médico possa ser punido por deixar de usar remédio ou técnica experimental.

 

Neste segundo  caso, o profissional médico somente responderá civilmente se for comprovado que o mesmo aplicou a técnica ou o procedimento equivocado ou de maneira negligente ou imprudente, bem como se houver comprovação que não existindo outra técnica ou medicamento para aquela situação patológica, deixou de fazer uso da mesma, sem explicação científica satisfatória,  sobretudo quando é solicitado pelo paciente a fazê-lo.

 

Poderá, entretanto, o profissional médico responder civilmente se usou de técnica, conduta ou procedimento médico, ou ainda se prescreveu medicamento que não possuem comprovada aplicação ou efeitos.

 

Apesar do médico, como os demais profissionais liberais, possuirem certa liberdade de conduta, desde que ética e legal, tal liberdade resta adstrita à adoção de comportamento, técnicas e condutas que cientificamente sejam comprovadamente eficientes, bem como além disso sejam no seu uso de domínio e conhecimento do profissional que lhe aplicará. Tal comportamento enseja a perícia do médico. Além disso deverá fazê-lo considerando e pesando os riscos que correrá seu paciente ( prudência) e fazê-lo de maneira séria, correta e atenciosa ( sem negligência). A mesma situação é aplicada à prescrição de medicamentos.

 

Por fim resta dizer que, quando existem várias condutas, técnicas ou procedimentos, ou ainda medicamentos, que tenham a aprovação dos órgãos competentes, e cientificamente haja comprovação de seus resultados, é liberdade do médico escolher entre eles, não podendo ser responsabilizado civilmente por isso, salvo se ao aplicar os mesmos, como já explanado, age com culpa ou dolo ao causar prejuízos ao seu paciente.

 


[1] - Há observar-se que os Tribunais Superiores vêm entendendo que, apesar da responsabilidade civil do médico ser em geral subjetiva e de sua obrigação ser de meio, em algumas intervenções médicas, como no caso das cirurgias plásticas estéticas esta responsabilidade é objetiva e esta obrigação de resultado.


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